Ela se chamava Clara, e talvez esse nome já dissesse tudo: transparente demais para um mundo que valoriza máscaras, pura demais para quem não sabe amar. Vivia com o coração escancarado como uma janela aberta em tarde de verão, onde qualquer brisa entrava, mas ninguém parava para admirar a paisagem. E nessa janela, um dia, entrou ele.
Caio chegou como chegam os furacões disfarçados de brisa. Um sorriso fácil, olhar que mirava fundo e parecia ver tudo — menos ela. Clara o conheceu na aula de fotografia, quando ele, desajeitado com a câmera, fez dela motivo de risos ao confundir foco com exposição. Ela riu também, mas foi por dentro que algo se acendeu. Um lampejo de interesse, aquele calor mudo que antecede o amor — ou o desastre.
Ela se apaixonou com a docilidade de quem nunca aprendeu a se defender. Guardava bilhetes não enviados, frases ensaiadas que morriam na boca, e olhares demorados enquanto ele contava histórias sobre outras mulheres. Caio era o tipo que brilhava — não porque era luz, mas porque sabia refletir a dos outros. E Clara, sem perceber, foi se apagando aos poucos.
Houve dias em que ela acreditou que ele sentia algo. Um elogio perdido, uma gentileza fora de hora, uma carona oferecida em silêncio. Mas eram só sobras, acasos, esmolas sentimentais dadas a quem amava com fome. E ela, faminta, aceitava.
Ele, por outro lado, falava de outra. Uma tal de Isadora, com riso fácil e jeito de tempestade. Clara ouvia tudo com um nó na garganta, fingindo interesse, tentando achar sentido na própria dor. Talvez pensasse que amar era resistir, que um dia ele a veria — que bastaria estar ali, firme, presente, constante. Mas amar não deveria ser um teste de resistência.
Os amigos a alertaram. Disseram que ela merecia mais, que ele era distraído, que não enxergava além de si mesmo. Ela sorria, como quem entende, mas não consegue aplicar. Como quem sabe que está se afogando, mas ainda assim prefere o mar.
O ápice veio numa festa qualquer, dessas em que a música é alta e os sentimentos, mais ainda. Ela o viu beijando Isadora no meio da sala, como quem nunca teve dúvida. E ali, entre goles amargos e batidas do coração fora do compasso, Clara soube: não havia espaço para ela naquele enredo. Nunca houve. Ela amava sozinha, como se ama uma estrela — bonita de se olhar, inalcançável de se tocar.
Naquela noite, ela foi embora sem dizer adeus. Chorou até dormir, e no dia seguinte acordou como quem perde um membro: sentia falta, mas sabia que precisava aprender a viver sem. Parou de frequentar as aulas, deixou de seguir seus passos, e pouco a pouco reconstruiu-se. Com dificuldade, com recaídas, com silêncio.
Anos depois, encontrou Caio numa livraria qualquer. Ele sorriu, como sempre. Disse que sentia saudade, perguntou onde ela esteve, falou que sempre gostou do jeito dela, que talvez tivessem se cruzado na hora errada. Ela apenas sorriu. Não por amor, mas por alívio. Porque naquele momento, Clara já não amava mais.
E assim, como quem fecha a janela para um vento que não traz alívio, ela se despediu. Com a leveza de quem aprendeu, ainda que com dor, que o amor — o verdadeiro — não mora onde não há reciprocidade. E que se amar demais a quem não merece é se abandonar aos poucos.
E Clara já não se abandonava.
P.S: Essa Fanfic conto, crônica ou qualquer nome que você queira dar, ou eu chama-la é criação minha. Por favor respeito os direitos autorais dela.
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