Mostrando postagens com marcador Arthur e Laura. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Arthur e Laura. Mostrar todas as postagens

domingo, 18 de maio de 2025

Conto: Quando a Chuva Tem Nome


Eu só posso estar ficando louca. Como pode uma simples voz causar esse tipo de arrepio, percorrer minha espinha como um sussurro íntimo, me fazer esquecer o que estava fazendo, onde estava indo, quem eu era? Era só uma voz. Era isso o que eu dizia a mim mesma, tentando recuperar o controle dos pensamentos que giravam feito folhas em vento forte. “Vamos lá, menina, respira fundo. Esquece o som dessa voz. Ficar assim não vai te ajudar.” Mas o corpo parecia não me obedecer. O coração acelerado não ouvia meus comandos racionais.

Foi então que ele se aproximou. Os cabelos um pouco bagunçados, o olhar calmo de quem carrega o tempo no bolso e um sorriso que já nasceu meio vitorioso, como se soubesse que eu não conseguiria disfarçar o tremor nas mãos.

— Eu me chamo Arthur — disse, rindo com naturalidade. — Quando nos esbarramos, você deixou cair suas chaves no chão. Quando percebi, saí correndo pra te alcançar. Acho que emagreci uns dois quilos no processo.

O sorriso dele tinha o poder irritante de ser encantador. Um riso fácil, sem pretensão, que fazia a tarde parecer menos abafada.

— Obrigada, sou a Laura — foi tudo o que consegui dizer. Mas por dentro, meu corpo gritava: Lá vai você ficar parada, menina! Pergunta logo o que está remoendo sua cabeça! Então, antes que o silêncio se tornasse incômodo, soltei, hesitante:

— Essa voz… eu já escutei ela em algum lugar.

Ele arqueou uma sobrancelha, curioso.

— Minha voz?

— Aham… eu conheço sua voz — insisti. — Mas não sei como. Nunca falei com você. Acho…

Arthur me olhou de um jeito que me desmontou. Como se ele tivesse acabado de lembrar de algo muito antigo, algo guardado a sete chaves e que, por algum motivo inexplicável, resolveu emergir naquele exato momento. Passou a mão pelo queixo, deu dois passos para trás e me olhou de cima a baixo com um sorriso travesso.

— Pequeninha, fofa, com uma voz e um sotaque interessante… hum, você me faz lembrar de uma amiguinha.

Franzi a testa.

— Que amiguinha?

Ele deu uma risada baixa, quase nostálgica.

— A minha pequeninha tarada por chuva.

Demorei dois segundos para processar. E então caiu a ficha. Abri um sorriso largo, quase infantil, e deixei a gargalhada escapar, leve como o início de uma tempestade de verão.

— Chuvinha? Chuvinha tentadora é você?

Arthur assentiu com um olhar meio culpado, meio satisfeito.

— Em carne, osso e algumas gotas de saudade.

Foi como se uma janela se abrisse dentro de mim. Uma memória antiga, dessas que a gente enterra sem querer, voltou à tona com uma nitidez absurda. Ele era o garoto das noites de voz no chat de áudio, das conversas aleatórias em fóruns sobre música e livros. Aquele que me chamava de “chuva” porque, segundo ele, minha risada lembrava o som das gotas batendo no telhado.

Na época, éramos dois estranhos conectados por fones de ouvido e tardes sem pretensão. Nunca trocamos nomes reais, nunca vimos rostos. Apenas vozes. Era isso. Era a voz dele. Agora fazia sentido. Aquela voz tinha sido, durante um tempo, meu abrigo favorito.

— Eu não acredito — murmurei, meio zonza com a coincidência absurda. — Você era real esse tempo todo.

Arthur encolheu os ombros com um sorriso quase doce.

— Sempre fui. Mas confesso que preferia o mistério. Até te ver hoje. Aí percebi que queria descobrir se a chuva ainda caía igual.

Ficamos em silêncio por um momento. Um silêncio confortável. As pessoas passavam apressadas ao nosso redor, a cidade seguia em sua rotina barulhenta e impessoal, mas ali, entre nós, havia algo suspenso, suave, inesperado.

— E aí, chuvinha — ele disse, com aquele tom provocativo que me fez sorrir mesmo sem querer. — Vai me deixar descobrir se a tempestade ainda mora em você?

— Só se você prometer que não vai mais fugir da chuva.

Ele sorriu como se já soubesse a resposta antes mesmo de perguntar.

E então, como se fosse um trecho que o universo esperava para tocar há anos, começou a chover.

Não corremos.
Não nos escondemos.
Apenas ficamos ali, encharcados, rindo.

Como se o tempo todo, tudo estivesse esperando apenas aquele reencontro.

P.S: Essa Fanfic conto, crônica ou qualquer nome que você queira dar, ou eu chama-la é criação minha. Por favor respeito os direitos autorais dela.