Desde pequena, Melanie era diferente. Não no sentido óbvio que os adultos gostam de apontar — ela não era excessivamente tímida, nem tão brilhante a ponto de chamar atenção nas aulas. Mas enquanto o mundo dormia e se perdia em fragmentos confusos de sonho, Melanie caminhava por florestas que respiravam, cidades que flutuavam no céu, mares cujas ondas cantavam em línguas antigas. Seus sonhos não eram feitos de névoas — eram tão vívidos que, ao despertar, ela sentia o cheiro da madeira molhada, ouvia ainda o eco das vozes que a chamavam por nomes que ela nunca soube que tinha.
Ao completar dezessete anos, algo mudou. Ela começou a despertar dentro dos próprios sonhos — não como expectadora, mas como alguém que escolhia onde ir, o que dizer, o que tocar. Descobriu, com o tempo e alguma leitura escondida, que aquilo tinha nome: projeção astral.
E foi numa dessas noites, em um campo de girassóis sob um céu violeta, que ela o viu pela primeira vez.
Peter.
Não foi ele quem disse seu nome — foi o vento. Soprando entre as flores, sussurrando em seu ouvido com um calor quase humano: Peter...
Ele estava parado ao longe, de costas para ela, com as mãos nos bolsos de uma calça escura. Tinha o cabelo castanho, desalinhado como se nunca tivesse conhecido um pente, e uma presença que fazia o tempo ali desacelerar. Melanie tentou correr até ele, mas o campo parecia se estender a cada passo — e quando enfim o alcançou, ele se virou… mas seu rosto, sempre seu rosto, era um borrão de sombra e luz. Uma metade oculta, como se o universo ainda não tivesse decidido o que ele era.
— Quem é você? — ela perguntou, tentando tocar seu braço.
— Você sabe — ele respondeu, com uma voz que era ao mesmo tempo familiar e nova, como uma lembrança esquecida da infância.
Acordou chorando, sem saber por quê.
No dia seguinte, tentou escrever sobre ele em seu diário. "Peter" era tudo o que tinha. Nenhuma pista de onde ele morava, de quem era, por que seus olhos — embora nunca vistos — lhe causavam tanto arrepio no peito.
Noites seguintes, ela tentou reencontrá-lo. Aprendeu a se concentrar antes de dormir, a visualizar o campo de girassóis. Às vezes, dava certo. Às vezes, encontrava-se em outros lugares: uma estação de trem em ruínas, uma ponte suspensa entre dois mundos, um deserto onde as estrelas caíam como neve. E Peter estava sempre lá — de costas, de perfil, atrás de uma neblina ou com o rosto mergulhado em sombra. Nunca completamente visível. Mas sempre presente.
Havia uma conexão entre eles que não podia ser explicada. Ela sentia isso nos ossos, como se tivessem se encontrado mil vezes antes, em vidas que ela mal conseguia lembrar.
Certa noite, num jardim onde as flores sussurravam segredos ao vento, Melanie ousou mais.
— Por que não consigo ver você? — perguntou, com a voz embargada. — Por que está sempre escondido?
Peter hesitou. Pela primeira vez, sua silhueta pareceu tremular, como se estivesse prestes a desaparecer.
— Porque você ainda não está pronta — disse. — Algumas verdades não sobrevivem à luz do dia.
Ela acordou com o coração acelerado, a respiração falha, como se tivesse corrido mil quilômetros em direção a algo que escapava por entre os dedos.
Mas não desistiria.
Porque, de algum modo que nem ela mesma compreendia, Melanie sabia: encontrar o rosto de Peter seria como encontrar uma parte perdida de si mesma.
E enquanto o mundo dormia em silêncio, ela fechava os olhos com um sussurro no peito.
Peter... estou chegando.
P.S: Essa Fanfic conto, crônica ou qualquer nome que você queira dar, ou eu chama-la é criação minha. Por favor respeito os direitos autorais dela.


Nenhum comentário:
Postar um comentário