Dizem os anciãos da Floresta de Uvarrah que, muito antes dos homens erguerem cidades de pedra e esquecessem a linguagem do vento, havia dois guardiões das sombras e da luz: Maegor, o lobo negro de olhos como brasa viva, e Selara, a loba branca de olhos tão azuis quanto o céu antes da tormenta.
Eram irmãos de alma, nascidos sob eclipses distintos, marcados pelos espíritos antigos para carregar o fardo e o destino dos Urvanyn, a antiga linhagem dos licantropos — aqueles que andavam na pele do lobo e do homem, guardiões da harmonia entre o mundo selvagem e o mundo que caminha sobre duas pernas.
Mas havia uma lenda esquecida, enterrada sob cinzas e ossos antigos. Uma profecia que dizia:
“Quando a Lua sangrar no céu sem nuvens,
E o uivo dos últimos ecoar sem resposta,
O tempo dos Urvanyn se findará,
A pele será tomada,
E o sangue da noite se perderá.”
Essa era a Profecia da Lua Rubra, temida por todas as alcateias ocultas. Muitos a consideravam apenas um sussurro de superstição. Mas Maegor sonhava com ela. No fogo de suas visões, via corpos tombando, o céu em chamas, os homens com armas de prata e olhos vazios.
Selara, com sua calma cristalina, era o equilíbrio de seu irmão. Onde ele via destruição, ela via sinais. Onde ele rugia, ela escutava. Juntos, percorriam os territórios antigos, consultando espíritos da mata, lendo símbolos nas pedras musgosas, ouvindo as árvores contarem seus pesadelos.
Foi numa clareira esquecida, onde o tempo não ousava tocar, que encontraram o Oráculo de Cinzas, um espírito ancestral em forma de corvo de olhos múltiplos.
— A Lua sangrará no ciclo que virá — grasnou ele, com voz de muitos ventos. — Mas a profecia não é pedra, é barro. E barro pode ser moldado.
— Como? — rosnou Maegor, com fúria nos olhos.
— O sangue de um traidor. O sacrifício de um inocente. E o juramento diante da Fenda da Morte.
A resposta do Oráculo fez o silêncio se curvar. Um traidor? Um inocente? A Fenda era um lugar amaldiçoado, onde a terra se rasgava e o mundo dos vivos tocava a pele dos mortos.
— Não faremos isso — disse Selara. — Não sacrificaremos um puro por nossa salvação.
— Então pereceremos todos — respondeu Maegor, em voz baixa, como se as palavras doessem mais do que mil garras.
Mas o tempo corria, e a Lua, no céu, ganhava um tom pálido de rubi a cada noite.
Os dois lobos vagaram entre clãs esquecidos, buscando um traidor que entregara sua raça aos humanos séculos atrás. E encontraram Theron, um licantropo exilado, que jurou ter feito o que fez para salvar sua alcateia da extinção — apenas para vê-los todos mortos pelas mãos dos homens.
Theron aceitou o fardo do sangue. Mas quando chegaram à Fenda da Morte, uma escolha precisou ser feita: o sangue de um inocente seria necessário. Selara olhou para Maegor. Ele compreendeu o que ela pensava. Ela se ofereceria. Ela, a luz, o coração da esperança.
— Não — gritou Maegor. — Eu carrego a sombra. Deixe que a sombra se sacrifique.
Mas o ritual exigia pureza. Somente quem nunca ferira por prazer, somente quem amava mais do que temia, poderia ser o Coração da Redenção.
Selara caminhou até a borda da Fenda, seu corpo banhado pela luz rubra da lua, já tingida. O vento sussurrava como uma prece. Ela se virou para o irmão.
— Proteja os nossos, Maegor. Cuide da floresta. Ensine os que virão. Eu serei a memória.
Quando o sangue da loba branca tocou o chão da Fenda, a Lua estremeceu no céu. Seu vermelho se dissipou como fumaça em vento forte. A noite chorou. E Maegor, agora sozinho, soltou um uivo que ecoou por todos os vales e montanhas, despertando os antigos e os jovens, dizendo que a lenda ainda vivia.
Desde então, em toda Lua cheia, dizem que se vê um vulto branco dançando entre as estrelas, e um lobo negro de olhos vermelhos vigiando a terra, para que a Lua nunca mais sangre.
E os Urvanyn seguem existindo, entre as sombras e a luz, protegidos por um pacto selado com amor e perda.
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