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sábado, 31 de maio de 2025

Conto: O Lobo e o Filho da Terra


Há muito tempo, quando o vento ainda sussurrava os segredos do Grande Espírito aos ouvidos atentos dos homens, viveu um jovem guerreiro chamado Takai, cujo nome significava "o Silencioso". Ele pertencia à Nação do Vento do Norte, um povo que ouvia os sinais da floresta e andava sem ruído entre as árvores. Mas Takai era diferente. Apesar de seus olhos atentos e coração bom, carregava dentro de si um vazio, um silêncio que nem o canto dos pássaros nem a dança das folhas podia preencher.

Certa noite, ao caminhar sozinho sob a lua cheia, Takai ouviu um uivo longo, profundo, que fez seu espírito estremecer. Não era um som comum. Era um chamado. Seus pés se moveram como guiados por algo maior do que ele mesmo, e assim ele seguiu o som pelas colinas, entre as sombras, até encontrar um lobo de pelos brancos como a neve, com olhos da cor do âmbar derretido.

— Você ouviu — disse o lobo, com voz que não saía da boca, mas entrava direto na alma.

Takai não recuou. Não se surpreendeu. Seu povo conhecia histórias de espíritos-animais, mas essa era a primeira vez que via um com os próprios olhos.

— Eu ouvi — respondeu o jovem. — E vim.

O lobo se ergueu sobre as patas dianteiras e fitou o homem como se pudesse enxergar até sua primeira lágrima.

— Então escute, Takai, filho da Terra. Eu sou Kûrah, aquele que caminha entre dois mundos. A floresta é minha casa, mas também conheço os caminhos da alma dos homens. Vim para te ensinar, se você tiver coragem de aprender.

Takai assentiu. Assim começou seu tempo com o lobo.

Durante luas inteiras, Kûrah lhe ensinou os segredos das árvores, o sussurro das águas, a canção dos ventos. Mostrou como os animais falam mesmo sem palavras, como cada folha caída carrega uma mensagem do ciclo da vida. Ensinou-o a caçar sem crueldade, a colher sem cobiça, a dormir ouvindo o coração da terra.

— A floresta não é apenas onde se vive — disse certa vez o lobo. — É onde se ouve. E quem ouve, compreende o Todo.

Mas Kûrah também falava dos homens.

— Eles esquecem, Takai. Esquecem que o sangue deles veio da terra, que a primeira respiração foi dada pelo vento. Por isso vivem em guerra com tudo. Guerra com os outros, com si mesmos, com o tempo.

O jovem ouvia em silêncio, mas algo dentro dele mudava a cada palavra.

Certa noite, sob a mesma lua cheia de seu primeiro encontro, Kûrah o chamou para um círculo de pedras. Ali, o lobo olhou fundo em seus olhos e disse:

— Takai, ensinei-te tudo que podias aprender como homem. Mas há algo mais.

O ar ficou denso. As estrelas pareciam ouvir.

— Eu não sou apenas lobo — continuou Kûrah. — Sou também homem. Vivo entre dois mundos, entre duas naturezas. Sinto o cheiro da terra e o peso da alma humana. Carrego o instinto e a razão, a garra e a compaixão. E agora te pergunto, filho do silêncio: queres ser como eu?

Takai sentiu o coração bater como tambor de guerra. Parte de si desejava a liberdade da floresta, os sentidos aguçados, a verdade pura do lobo. Mas sabia que isso exigia renúncias — talvez nunca mais pudesse viver entre os homens como antes. Seria sempre metade de cada coisa, e nunca inteiro em uma só.

— O que preciso fazer? — perguntou.

Kûrah avançou e roçou a testa na de Takai.

— Apenas aceitar. A transformação começa dentro. Se teu espírito for forte o bastante, tua carne seguirá.

Naquela noite, Takai adormeceu sob a luz prateada. E em seus sonhos correu por entre as árvores, sentiu o cheiro do cervo, a força em suas patas, o vento cortando seus pelos. Quando acordou, seus olhos eram dourados como os de Kûrah.

A partir daquele dia, o povo do Vento do Norte contava histórias de dois lobos que caminhavam juntos pela floresta: um de pelo branco como a neve, outro cinzento como a tempestade. Diziam que protegiam a terra, ensinavam aos dignos, guiavam os perdidos.

Mas apenas os de coração puro conseguiam ouvir seus uivos — pois eram chamados, como Takai fora, a viver entre dois mundos.

P.S: Essa Fanfic conto, crônica ou qualquer nome que você queira dar, ou eu chama-la é criação minha. Por favor respeito os direitos autorais dela.

quinta-feira, 29 de maio de 2025

Conto: Ayara e o Guardião da Floresta

 


Dizem que há corações que nascem com trilhas em vez de raízes — e que, quando o destino sussurra na direção da floresta, não há alma inquieta que consiga resistir. Era assim com Ayara, uma jovem de cabelos lisos e negros como a noite antes do fogo, olhos azuis como o reflexo da lua nas águas paradas e pele marcada por histórias: tatuagens em espirais, folhas, luas e lobos.

Ayara sempre fora fascinada por mistérios — não os dos livros, mas os que se escondem atrás do silêncio das árvores. Estudava mitologia indígena na universidade, mas seu espírito ansiava por mais do que palavras em papel. Queria sentir as lendas pulsarem sob os pés. Por isso, quando surgiu a oportunidade de integrar um grupo de pesquisa no coração da Floresta Kaluanã, não hesitou.

Instalou-se em um acampamento pequeno, entre pesquisadores e guias nativos. Os dias eram cheios de anotações, registros e longas caminhadas. Mas eram as noites que mais a chamavam — quando os sons da mata se tornavam canção e os lobos, seus animais de alma, uivavam como se reconhecessem a loba que ela trazia dentro de si.

Em uma dessas manhãs quentes e úmidas, após uma trilha longa, Ayara caminhou sozinha até um rio escondido entre cipós e pedras. Ali, entre raízes e folhas caídas, despiu-se e entrou na água, deixando que a corrente fria levasse as poeiras e o cansaço.

Foi então que o sentiu: o arrepio. Não de medo, mas de ser observada por algo que não ameaçava, apenas... via. Levantou os olhos. No alto de um penhasco estreito, à sombra de uma árvore antiga, estava ele.

Um homem vestido com penas, colares de sementes, o corpo nu parcialmente coberto por pinturas em forma de garras e redemoinhos. Ao seu lado, um grande gavião-real, de olhos tão vivos quanto os dela. O vento brincava com suas penas, e havia um silêncio entre eles — o tipo de silêncio que antecede o sagrado.

Ayara não se cobriu. Sentia-se estranhamente em casa sob aquele olhar. O homem desceu como se fizesse parte da floresta, pés leves, passos firmes. Quando se aproximou, falou com voz de trovão abafado:

— “Você tem os lobos tatuados no corpo. Por que carrega os guardiões?”

Ela sorriu, desarmada.

— “Porque eles são minha alma, e eu sou parte da matilha da terra. E você, quem é?”

— “Sou Aruani, filho do gavião e da neblina. Vivo onde os homens se esquecem de procurar.”

Ayara sentiu, então, algo mais forte que curiosidade: um reconhecimento antigo, como se suas peles tivessem se encostado em outra vida.

Nos dias que se seguiram, Ayara desaparecia do acampamento durante as manhãs e voltava ao entardecer com olhos distantes e um leve sorriso. Ninguém sabia que ela se encontrava com Aruani sob o abrigo das árvores, onde ele lhe contava as histórias que nunca foram escritas. Ela ouvia sobre a serpente que tece os rios, o espírito do fogo que dança nas fogueiras dos antepassados, e sobre os amantes que viraram estrelas porque o mundo não os compreendia.

Ele tocava sua pele tatuada como se decifrasse profecias. Ela acariciava suas penas como se enxergasse sua alma em cada fibra. O gavião voava em círculos acima deles, guardando o amor que florescia.

Uma noite, Ayara sonhou com um lobo branco caminhando ao lado de um gavião, sob a luz da lua. No sonho, a floresta sussurrava: “Vocês são partes do mesmo canto, mas cantam em línguas diferentes.

Acordou em lágrimas. Sabia que Aruani não era inteiramente deste mundo. Ele vivia entre os véus, em um espaço onde tempo e carne não eram os mesmos. Seu corpo era real, mas sua essência era antiga demais para o concreto.

Na última noite antes de sua partida, Ayara foi ao mesmo rio, o da primeira visão. Aruani a esperava.

— “Preciso voltar para o mundo dos homens. Mas não quero esquecer...” — disse ela.

Ele se aproximou, encostou a testa na dela e murmurou:

— “Se um dia você escutar o canto de um gavião ao lado de uivos noturnos, saberá que ainda estou por perto.”

E entregou-lhe uma pena negra com a ponta prateada.

Ela partiu no dia seguinte, mas nunca mais foi a mesma. Tornou-se escritora, contadora de lendas e estudiosa das histórias que só se revelam aos que escutam com o coração. Em sua casa, havia pinturas de lobos, penas e olhos de gavião.

E, às vezes, muito raramente, em noites de lua cheia, Ayara ia até o bosque mais próximo. Lá, sentava-se sob uma árvore antiga. E quando o vento soprava certo, ela sentia o arrepio de novo.

Porque alguns amores não moram em cidades ou florestas. Moram entre os mundos — onde o sagrado toca o humano.

P.S: Essa Fanfic conto, crônica ou qualquer nome que você queira dar, ou eu chama-la é criação minha. Por favor respeito os direitos autorais dela.

Conto: Corações da Floresta


Era uma vez, em um tempo em que o céu falava com a terra e os rios ainda sussurravam segredos antigos, uma aldeia indígena escondida no coração da Floresta Encantada. Ali, a natureza e o povo viviam em perfeita harmonia, guardando saberes ancestrais e respeitando cada folha, cada pedra, cada sopro do vento.

Na aldeia dos Yaraê, viviam duas jovens corajosas: Jacy, filha do pajé, com olhos tão brilhantes quanto a lua cheia, e Cauã, um jovem caçador que sabia escutar o som do silêncio. Em outro extremo da mesma floresta, na aldeia dos Tupinã, moravam Aruanã, um guerreiro de espírito livre e coração calmo como o rio, e Iandê, uma jovem curandeira de risada fácil e mãos que curavam só de tocar.

Diziam que os dois povos haviam se afastado há muitas luas, por causa de uma antiga disputa por território sagrado. Mas o tempo, esse velho espírito que tudo transforma, decidiu unir os caminhos de seus filhos.

Durante a Festa da Lua Nova, quando os povos celebravam o renascimento do ciclo lunar, os Yaraê decidiram visitar a aldeia Tupinã como um gesto de paz. As estrelas cintilavam como nunca naquela noite, e os anciãos diziam que era sinal de bênçãos.

Foi ali, entre cantos sagrados e danças em volta da fogueira, que os olhos de Jacy cruzaram com os de Aruanã. A conexão foi tão imediata que os velhos sábios da floresta sentiram o ar mudar. Ao mesmo tempo, Cauã avistou Iandê oferecendo chás e flores às crianças da aldeia — e seu coração, antes tão fechado, se abriu como uma flor tocada pelo sol.

Naquela noite, enquanto os corpos dançavam, as almas se reconheciam. Mas o amor verdadeiro nunca é isento de desafios, especialmente quando carrega o peso de histórias antigas.

Os mais velhos de ambas as aldeias desconfiaram da aproximação. “Eles são diferentes de nós,” diziam alguns. “Não devemos repetir os erros do passado,” alertavam outros.

Jacy e Aruanã começaram a se encontrar em segredo, às margens de um lago onde os vaga-lumes dançavam como espíritos felizes. Cauã e Iandê se encontravam numa clareira onde o vento fazia as folhas cantarem melodias suaves.

E foi durante uma dessas noites secretas que ouviram a voz da própria floresta. O espírito Anhangá, guardião dos caminhos e protetor dos apaixonados puros, apareceu na forma de um cervo branco. Com olhos profundos, ele falou:

— “O amor de vocês pode curar as feridas do passado, mas para isso, precisam provar que são guiados pela verdade e não pela paixão passageira.

Anhangá então lhes deu uma missão: encontrar o Coração da Mãe Terra, uma flor dourada que só florescia uma vez a cada cem anos, no ponto onde as águas do rio sagrado se encontravam com a raiz mais antiga da floresta.

Jacy e Aruanã partiram de mãos dadas, guiados pelos sonhos. Cauã e Iandê seguiram por outro caminho, guiados pela intuição. Foram dias de provações — enfrentaram animais encantados, enfrentaram seus próprios medos, e por fim, encontraram a flor sagrada em perfeita harmonia, os quatro juntos, no mesmo instante, como se os caminhos tivessem sido feitos para se cruzarem ali.

Ao entregarem a flor às aldeias, os corações dos anciãos se abriram. As feridas do passado começaram a cicatrizar, e uma nova aliança foi feita entre os Yaraê e os Tupinã.

Jacy e Aruanã se casaram sob a grande samaumeira, árvore sagrada que unia os céus e a terra. Cauã e Iandê celebraram sua união à beira do rio, onde as águas cantavam de alegria.

E desde então, contam-se nas rodas de história que o amor, quando puro como o vento da floresta, é capaz de curar até os espíritos mais antigos. E que duas flores, uma prateada como a lua e outra dourada como o sol, ainda nascem lado a lado na clareira onde os quatro corações se encontraram.

E viveram felizes, em harmonia com a floresta, até que a lua deixasse de nascer.

P.S: Essa Fanfic conto, crônica ou qualquer nome que você queira dar, ou eu chama-la é criação minha. Por favor respeito os direitos autorais dela.